Bolsonaro visita obra de hospital, provoca novas aglomerações e é criticado por Mandetta e Caiado
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) mais uma vez ignorou orientações de autoridades sanitárias no enfrentamento ao coronavírus e promoveu aglomerações neste sábado (11) ao visitar a recém-iniciada obra de um hospital de campanha em Águas Lindas de Goiás (GO), município a 57 km de Brasília.
O ministro Luiz Henrique Mandetta (Saúde), que acompanhou de longe as aglomerações, criticou o comportamento do presidente. Mandetta viveu nos últimos dias momentos de intenso embate com Bolsonaro, correu risco de demissão, mas segue no cargo após conversa direta com o presidente.
Neste sábado, autoridades e convidados se aglomeraram na chegada do presidente ao canteiro de obras da unidade emergencial. Do lado de fora, dezenas de pessoas se amontoaram próximo ao terreno.
O presidente fez o deslocamento de helicóptero, o que o impossibilitou de ler placas espalhadas pela prefeitura da cidade na estrada onde estava escrito "Proteja-se. Só há uma maneira de conter o coronavírus: prevenção. Por isso, fique em casa! Águas Lindas precisa vencer mais esta batalha".
Os apoiadores gritavam a favor de Bolsonaro e contra a imprensa e o governador Ronaldo Caiado (DEM-GO), que rompeu politicamente com o presidente por discordar de sua postura no enfrentamento da crise.
Alguns carregavam também cartazes onde se lia "remédio do Bolsonaro", uma menção à hidroxicloroquina, medicamento ainda em teste e cujo uso amplo é defendido por Bolsonaro.
Assim que desceu do helicóptero, Bolsonaro subiu em um barranco e foi até um grupo próximo a um cordão de isolamento. Em seguida, aproximando-se de Caiado, brincou com o governador, que estendeu um pote de álcool em gel ao presidente.
Técnicos apresentaram a planta do hospital a Bolsonaro e o governador agradeceu a execução da obra. Não houve discursos.
Depois da visita, à qual a imprensa não teve acesso, seguiu foi até outros focos de aglomeração. Bolsonaro retirou a máscara enquanto cumprimentava os simpatizantes.
Após a partida do presidente, Mandetta condenou a aglomeração de pessoas. "Posso recomendar, não posso viver a vida das pessoas. Pessoas que fazem uma atitude dessas hoje daqui a pouco vão ser as mesmas que vão estar lamentando", afirmou o ministro.
Questionado se a orientação valia também para o presidente da República, Mandetta afirmou que "vale para todos os brasileiros". Mandetta não acompanhou Bolsonaro no momento em que ele foi até as pessoas. "Procuro seguir uma lógica de não aglomeração", disse o ministro.
Caiado também falou em tom crítico à atitude de Bolsonaro em Águas Lindas de Goiás.
"Ele [Bolsonaro] que deverá explicar esta situação. Esta posição não foi a minha. Ele é o presidente, e eu sou o governador. A minha posição foi a que vocês acompanharam. Esta é a posição que manteremos até o dia 19", afirmou o governador de Goiás, mencionando a data em que o estado deve começar a flexibilizar o isolamento social em algumas regiões.
Caiado foi criticado por um grupo de moradores por causa das regras de restrição de funcionamento do comércio. "Eu sigo a parte da ciência e sigo também as regras do Ministério da Saúde. Então, esta é minha posição. As regras implantadas no estado de Goiás são as regras do Ministério da Saúde. Então, minha posição é contra a liberação neste momento", afirmou.
Neste sábado, a Human Rights Watch, ONG que defende e pesquisa os direitos humanos, divulgou relatório que diz que o presidente está colocando os brasileiros em "grave perigo ao incitá-los a não seguir o distanciamento social" para conter a transmissão da Covid-19.
No documento, a organização afirma ainda que Bolsonaro "age de forma irresponsável disseminando informações equivocadas sobre a pandemia".
No mês passado, por exemplo, em meio a um protesto pró-governo, Bolsonaro participou dos atos, tocou simpatizantes e manuseou o celular de alguns apoiadores para fazer selfies em Brasília. "Isso não tem preço", disse, à época, em suas redes sociais.
Em outra ocasião, fez um tour por diferentes pontos do comércio de Brasília, o que gerou aglomeração de pessoas no momento em que a OMS (Organização Mundial da Saúde) e o próprio Ministério da Saúde recomendam isolamento social para evitar o contágio do coronavírus. Bolsonaro naquele dia falou com funcionários de supermercados e padarias e com vendedores autônomos.
Já nesta última sexta-feira (10), em outro passeio por Brasília, Bolsonaro foi cercado por moradores e, antes de entrar no carro, ignorou orientações sanitárias e, sem demonstrar nenhuma preocupação com a pandemia, primeiro coçou o nariz com o dorso da mão direita e, segundos depois, passou a cumprimentar uma idosa e outros apoiadores.
Um dia depois, em Goiás, apesar de toda a estrutura montada para receber Bolsonaro, o evento não entrou na agenda oficial do governo e sequer foi confirmado pela Secretaria de Comunicação. Caiado foi convidado para acompanhar Bolsonaro na quinta-feira (9). Antes um aliado de primeira hora, o governador de Goiás havia rompido com o presidente no final do mês passado.
O rompimento se deu depois do pronunciamento feito em rede nacional na noite anterior. O goiano anunciou que não conversaria mais com Bolsonaro e que o estado não atenderia suas determinações sobre o combate ao coronavírus.
À época, Caiado, que é médico, criticou as declarações feitas por Bolsonaro sobre os impactos econômicos da crise e seus ataques aos governadores, qualificando-os como um “discurso totalmente irresponsável”.
O hospital em Águas Lindas de Goiás começou a ser construído pelo governo federal em um terreno de 10 mil metros quadrados cedido e terraplanado pela prefeitura. A previsão é que a estrutura fique pronta em mais duas semanas. De acordo com o Ministério da Infraestrutura, estão sendo investidos R$ 10 milhões.
A unidade terá 200 leitos adaptáveis para unidades de tratamento semi-intensivas, com tubulação e suporte para respiradores. A operação ficará a cargo do Governo de Goiás, que contratará uma OS (organização social) para gerir a unidade.
Até o momento, apenas a carcaça do hospital está de pé. De acordo com vizinhos, o terreno só foi cercado com tapumes na quinta-feira. A escolha do local foi feita, de acordo com o governo federal, após pedido de apoio do governo de Goiás à União devido à necessidade de atenção especial à doença.
Águas Lindas de Goiás tem um hospital regional que começou a ser construído em 2004, mas foi apenas parcialmente inaugurado. As obras começaram naquela época a ser tocada pela prefeitura. Em 2013, o governo estadual assumiu o serviço.
Fonte: BCNews